sábado, 23 de abril de 2022

24/04

Eu escuto a mesma música incessantemente pra ver se tiro de dentro o que os anos não foram capazes de tirar. Anos. Eu disse: ANOS. É uma mistura de amor e arrependimento que já não sei separar nem nomear o que é o quê. Eu fecho os olhos e só vem em minha mente um pêssego mordido que não mordi. Eu não mordi o pêssego, vocês entendem?  Eu não mordi o pêssego e esse ato-não-cometido tem me doído as têmporas, os olhos e o coração. Eu passo horas olhando pro nada revivendo um passado que não vivi. O arrependimento de não ter feito, de não ter sido, me dói os ossos. É uma dor estranha, uma dor confusa, uma dor que faz com que eu escute a mesma música inúmeras vezes. E por quê? Me pergunto. Não sei - respondo. A sensação de ver tudo que poderia ter sido seu, ali, na sua frente, é assustadora. É a sensação de que tudo poderia ter sido diferente se você não tivesse a velha mania de evitar sentimentos. Eu tenho essa mania. Eu sei. Ele sabe. Ao ver tudo acontecendo claramente diante dos meus olhos eu me sinto nua, me sinto arrebatada por todo o sentimento que evitei há anos. Eu evitei e neguei e menti pra mim mesma e pra ele (embora ele me conheça como ninguém). Ao ver tudo acontecendo a ânsia dele me vem a tona. Eu não quero que ele seja meu, não quero roubar a vida que ele tem agora pra mim. Mas, inevitavelmente, eu quero ser dele. Eu quero. Eu sou. E dizer isso agora parece tão pequeno e tão libertador. Eu queria voltar atrás e morder o pêssego. Queria deixar esse sentimento desaguar naquela boca que desejo tanto. Queria olhar nos olhos e dizer que agora estou aqui, inteira, dele. Mas é tarde demais. A época do pêssego passou. Em mim, agora, resta um gosto amargo de uma fruta que não provei. Engulo o choro e sigo em frente. A vida tem dessas coisas, digo. E volto a ouvir a música que não me deixa esquecer.

quarta-feira, 11 de novembro de 2020

Rascunho

Será que ainda sei fazer isso? Será que ainda há em mim mil palavras a serem ditas? Será que ainda existem fantasmas no meu quarto? Me diz você! Eu continuo olhando pra uma parede branca às 23h de uma quarta morna.  Uma quarta morta talvez. Tão morta e morna quanto eu e você. Eu observo. Eu repenso. Eu questiono: - O que aconteceu aqui? Eu não sei. Você sabe? Parece que há algo perdido entre a carne e a alma. Aconteceu aos poucos. Foi se perdendo aos pedaços. Devagar. Um dia sim o outro não. Quando resolvi verificar já tinha partido. E o mais triste é que eu nem sei o que foi que partiu, o que foi se perdendo. O que foi?  Me conta você! É. Você mesmo. Você que vem aqui pra olhar minhas lágrimas e lamber minhas feridas. - O que aconteceu aqui? - pergunto. Não há resposta. Não há leitores sedentos por uma gota de inspiração que dará vida a um texto fodidamente real e bonito. Não há ninguém. Somos só nós. Eu e a parede branca. Será que eu ainda sei fazer isso?

sábado, 8 de abril de 2017

Abril, 08

Eu tenho tanto pra falar, mas algo me cala. Me sufoca. A embriaguez de um tempo bom ainda ecoa em mim. Eu não sei explicar quando. Eu não sei explicar como. Eu não sei em qual rua me perdi dessa vez. Não sei seu endereço, seu rumo. Só conheço seu gosto. Conheço seu corpo. Seu sexo. Suas idas e vindas em mim. Mas tudo é tão passageiro que não marca. Não penetra. Arde! É um fogo que não queima. E eu queria me queimar. Acendo um cigarro atrás do outro como se fosse me ajudar na confusão que há aqui dentro. Os pensamentos se espalham junto à fumaça. Me despedaço entre meus próprios dedos. Eu queria mais. Talvez mais do mesmo. Mas e a penitência que vem depois? E a cabeça no travesseiro que não sossega? A sua, não a minha. Eu peco pelo exagero. Sempre. Sou inteira demais, maluca demais, dramática demais. Mas dessa vez eu só quis um pedaço. Só quis a parte que você pôde me dar. Mas você me negou. Me negou qualquer indício do que poderia a vir a ser. Me negou a saudade. Me negou as palavras. Eu tenho tanto pra falar, mas algo me cala. Você me calou. Eu sigo muda...

sábado, 18 de março de 2017

Sobre as perdas

Algumas coisas se perderam nas idas e vindas do meu coração. Eu perdi o tato, perdi a voz, perdi a habilidade de escrever para exorcizar meus fantasmas. Perdi a vontade de escrever, para ser mais exata. Como se não houvesse finalidade alguma, como se o ato de escrever se resumisse ao ato de escrever puro e cru. Os fantasmas já não iam embora, as lágrimas já não escorriam depois de dias presas no meu olhar cansado e o peso no coração não aliviava. O fardo que carregava só aumentava e eu sentia que carregava o mundo nos meus bolsos. E carregava. E caminhava. E persistia. Eu abraçava o mundo como se fosse minha obrigação e, estranhamente, me surpreendi ao descobrir que não era. Tarde demais. Tardiamente me deparei com a verdade que todos sabem e ninguém conta para ninguém: somos nada. Me libertei. Mas eu sabia que alguma coisa havia se perdido no caminho percorrido até ali. Alguma coisa ficou para trás e eu nem pude notar quando de mim ela se desprendeu. As entrelinhas já não fazem mais sentido algum, muito menos as muitas bocas cheias de palavras que me cercam todos os dias. Eu escuto, mas não absorvo. Eu vejo, mas não observo. Me sinto vivendo numa cápsula protetora que impede com que eu me machuque, mas ao mesmo tempo me deixa o mais longe de mim que eu poderia estar. É uma via de mão dupla que me salva e me mata um pouco todos os dias. Me olho no espelho e me reconheço, mas há noites que durmo me perguntando sobre quem eu sou. Algo se perdeu nas idas e vindas do meu coração. Não há quem encontre. Não há indícios do que fora ou do que poderia vir a ser. Eu perdi o dom das palavras e peço perdão por entregá-las tão soltas assim. Elas só saíram e voaram tão sorrateiras que não pude devolvê-las a boca. Eu me perdi nas idas e vindas do meu coração. Eu vi o mundo de perto e toda a magia se perdeu. Quero acreditar, mas não consigo. Quero falar, mas a boca cala. O coração vadio se entrelaça em qualquer corpo despido, em bocas sem gosto e felicidades tão instantâneas que passam sem que eu consiga vislumbrar uma lembrança para me saciar mais tarde. A solidão me rói os ossos. Mas a máscara é posta na cara. A vida segue e o show tem que continuar.

sábado, 5 de março de 2016

Sobre a saudade...

Os fantasmas das dores assombram o quarto.
A solidão arrepia até os ossos.
Não sei quem sou.
Não sei quem és.
Quando lhe digo o que deve ser feito na verdade digo a mim.
Quase num sussurro.
Quase uma oração.
O espelho ja não me reconhece mais.
Minha face se perdeu em alguma esquina.
Entre tantos vícios.
Entre tanto estrago.
Olho as horas que não passam.
Vejo a vida, já tão consumida, passar pela janela.
Ninguém me vê.
Ninguém se vê.
O mundo inteiro é um buraco.
E a vida vai seguindo seu rumo assim, tímida e vagarosa, como quem pede licença pra ser.
E é.
E não é.
Mas talvez, só talvez, será.
Que garantia nós temos?
Eu não sei.
Eu não sei quem és.
Mas, claramente, agora você sabe quem eu sou.

sábado, 24 de agosto de 2013

5h51

Ah, mas relaxa. Relaxa que tá tudo em paz. Respira. Respira. Respira. Assim mesmo. Três vezes. O coração ainda bate. Então relaxa. Relaxa que eu vou atrasando os relógios enquanto você não passa. Há tempo. Ainda. E sempre. Relaxa. Respira. Vem.

terça-feira, 20 de agosto de 2013

3h20

Pensar demais fode tudo.
Quando se pensa demais, se faz pouco, quase nada.
Sentir é nada, inevitavelmente.
Quando se pensa demais, você ta fodido.
Devidamente fodido, cara.

Os pensamentos voam soltos pelos ares.
A boca cala.
O coração, filho da puta, não cessa.
Não quer cessar.
São noites inteiras de cabeça cheia e coração vazio. As noites são todas iguais.
Um dia eu quis ter o coração cheio, juro.
Eu já tive um coração cheio.
Desbotou.
O tempo tem a santa mania de desbotar as cores mais bonitas, as coisas mais bonitas.
Cheguei a acreditar que o tempo ajeitaria tudo, sabe? Que o tempo colocaria tudo no seu devido lugar.
Mas o tempo...
Ah, o tempo não ilumina, o tempo só apaga.
Apagou todas as luzes, devorou todas as cores e foi embora, tão rápido quanto veio.
E eu fico aqui, pensando que tudo já não presta, que a podridão do mundo amassou todas as minhas flores.
Sim, eu sei que faço parte da podridão do mundo, não precisa me lembrar.
Eu penso nisso o tempo todo.
Penso até tudo virar loucura na minha cabeça.

Quando se pensa demais você ta fodido, cara.
Fodido...
Mal pago...
Desbotado...
Preto e branco.

3h59

Eu queria escrever alguma coisa, qualquer uma, que explicasse essa loucura, esse afeto.


Qualquer explicação banal me serviria, mas não há.


Qualquer indício de uma suposta explicação, juro, me bastaria.


Qualquer uma.


Uma explicação velha, esquecida, suja.


Não há

!
Não há explicação, não há entendimento.


Queria poder aceitar sem entender, mas a razão não me deixa; a razão só me impede.


Se eu soubesse nomear.


Se, ao menos, eu soubesse...


está escuro lá fora, já anoiteceu há horas, e eu continuo aqui, de olhos bem abertos, revirando as gavetas emperradas procurando alguma coisa que nem sei se existe.


Talvez eu só precise de um tempo.


Talvez eu só precise esquecer...

(a porra do blog formatou o texto do jeito que quis, me impedindo de arrumá-lo)

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

O mundo é bão!

Eu me pareço com um desses romancistas baratos que acreditam que o mundo é tão pequeno que é possível carregá-lo no bolso.
Eu jogo; eu brinco; eu não levo nada a sério.
Me incomodo quando me levam a sério.
Mas, um dia, talvez, quem sabe?
Eu to sentada num banco vendo a vida passar. Às vezes a calmaria me cansa, então faço alarde. Quando o barulho me irrita, peço silêncio, me fecho e recupero a paz. Uma paz um tanto ilusória, confesso, mesmo assim não deixa de ser paz.
Empatia tem de sobra, simpatia tá em falta.
O mundo continua no meu bolso e eu quase nunca o tiro dali. Falta de interesse? Acredito que não. Proteção talvez. Não sei. Quem sabe? Eu sequer tento me proteger e faço estrago pra caralho.
Sigo! Pensando: viver é isso. Mesmo sabendo que eu corto um dobrado pra descomplicar o que não era complicado e eu compliquei.
É loucura, eu sei. Eu sou. Você é.
Eu carrego um hospício enorme no bolso.
Mas eu tenho uma carta na manga, um segredo guardado e então tá tudo bem.
To sentada num banquinho - sem violão - e a calmaria intensa tá me pedindo um alarde. Nego, obviamente. Alegando que já não tenho idade pra isso e que prometi: de agora em diante sem mais estragos.
Eu entendo - empatia ta rolando; não sorrio - a simpatia é sempre escassa.
Mas eu sei que ninguém aqui tá me levando a sério.
Não me levem, por favor!

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Mimimi

A incerteza traz inspiração?
E a certeza?
Há muito vivo o eterno clichê "entre dar a mão e acorrentar uma alma". A alma é sempre minha...
Eu tentei te avisar. Eu te contei sobre os monstros dentro do armário e o amor embaixo da cama. Mas, pra mim, o que é que sobrou?
A vida tem me pregado peças. Muitas pedras no caminho. Muitos desamores.
O que fazer?
O que dizer quando tudo já foi dito?
A verdade bate à porta, dizendo que não há nada pra mudar, nada pra discutir. Ela é a dona do jogo e dessa vez não há desculpas.
A vida me mata. A vida me cospe o dia vazio em todos os nasceres do sol.
E o meu querer?
E o meu amor?
O buraco do espelho diz mil coisas e me faz acreditar no que não vejo. Queria ser simples. Queria, ao menos, não dificultar as coisas. Mas suas cores dançam ao meu redor e me remetem para o lugar mais longe que vejo.
Você está tão longe e tão perto.
Tão longe e tão dentro.

O sorriso está gravado na memória, como algo bom que poderia ter sido e não foi. A cor dos seus olhos me prendem, me faz entender que o brilho não é meu. Talvez se todos nós estivéssemos rodando com a roda - aquela roda - você pudesse ser o rapaz que segura minha mão dessa vez. Se minha garganta não estivesse cansada e na renúncia eu não me encontrasse no quarto vazio, eu até gritaria seu nome. E seríamos felizes pelo breve momento do incerto.
Mas a vida - sempre a vida - precisa de certezas e, às vezes, de bocas coladas e segredos no íntimo do ouvido. A vida tem me pregado peças. Juro! São tantos corpos e tantas almas que eu tenho me perdido no caminho de volta pra casa. Tenho me perdido de você. Em você.

Na ânsia de te salvar tenho me traído inúmeras vezes. Na ânsia de consertar os estragos tenho desfeito e refeito todas as cartas do jogo.
A roda ainda está lá, girando, linda, no lugar mais longe que vejo. No lugar onde sem querer encontro e reencontro os olhos, o sorriso, a loucura...
No lugar mais longe que vejo te zelo ao dormir. E de uma vez por todas percebo, mais distante AINDA estou eu.

terça-feira, 2 de julho de 2013

03 de Julho

Queria te dizer tantas coisas.Contar os sonhos, a ânsia, o medo. Te lembrar dos momentos doces, das palavras cortadas pelas línguas, do brilho no olhar -  que há muito não vejo. Queria rir com seu riso e lhe fazer sorrir teu choro.
Não haverá choro.
Só nós.

O gosto do beijo consome minha boca, me empurrando para lugares onde eu deveria ir e não fui. Coração acelera no ritmo dos teus passos. Coração tão vagabundo que já não sabe que rumo tomar.
Eu não sei. Você sabe?

Se eu contasse todos os nossos segredos, as juras, as súplicas cuspidas no ouvido às quatro horas da manhã. Se eu contasse e recontasse nossos erros e acertos, ajudaria?

Há muito venho pensando em te dizer minhas mentiras mais sinceras. Há muito sinto uma necessidade em te ligar só para ouvir que está tudo bem ou que tudo vai ficar bem ou que se nada der certo a gente muda o roteiro.
Pura e simplesmente.
So nós.

Queria tantas coisas. Tantas, que a vontade do beijo já se perdeu nas entrelinhas. Eu só quero a paz do sorriso e a beleza do que há entre nós. E mesmo que não haja nada, se tudo for em vão e a vontade se perder para dar lugar ao novo gosto, à nova língua. Mesmo que tudo se perca. Sempre me encontrarei no seu abraço.

Você me faz lembrar o caminho de volta pra casa.
Me traz tranquilidade em meio ao caos.
So você.
So nós.

Queria te contar e viver tanta coisa. Tanta vida. Tanto gosto.

Tanto clichê.

Queria tudo, queria o mundo inteiro. Mas, no momento, desejo apenas que seja doce.
Que seja doce.
Que seja doce.
Será.
É!

sexta-feira, 28 de junho de 2013

(...)

Ela sente saudade, todas as noites. E até morre um pouco tentando esquecer o que nunca foi seu de fato. Ela briga, ela grita, ela faz de tudo pra se manter sã. Ela se esconde, escapa, corre pro lado oposto. Ela perde o jeito, desconhece o gosto.
Ela não sabe amar.

Ele a provoca, todas as noites. Não quer cuidado, não quer cautela. Ele quer agora, pra ontem. Já esperou tempo demais. Ele quer sorrisos e bocas e beijos. Ele quer o ato, sem delongas, sem demora.
Ele só sabe amar.

E todas as noites ela sente saudades do que nunca teve e morre um pouco tentando esquecer.
Ele cheira à saudade.
Ela sabe, ele sabe.
Mas ninguém conta pra ninguém.
Há um jogo estranho entre eles.
Ninguém ganha, ninguém perde.
Ninguém vive nada ali.
Mas eles cheiram a amor.
Eu sei.
Se conhecem há anos.
Se prometem há meses.
Nunca cumprem!
Ela desiste, ele insiste.
Ela briga e ele ri.
Quase um casal, embora não saibam, embora não vejam.
Cá entre nos, eles cheiram à loucura.
Eles beiram à loucura.
Todos os dias.