segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Cru

Se por um acaso você chegar a ler, finja que não o fez; só precisava extravasar.


Vai ficar tudo bem, Camila.

Nenhuma dor dura pra sempre.

Nenhuma confusão vigora e amanhã os seus pensamentos acordarão penteados outra vez.

Amanhã tudo isso vai ser engraçado, você vai ver.

Chora; pode chorar.

Alivia, não é?

Eu sei. Chora.

Chora a madrugada toda, fique triste, não precisa me explicar os motivos, eu sei o quanto as coisas desandaram e por isso você nem tem como explicar. Eu sei o quanto você quer esquecer o passado e o quanto acreditou que o presente poderia dar certo. Disse pra si mesma, e pra quem quisesse ouvir, que não se importava com o sentimento, mas dentro de você algo dizia que desse jeito estava bom.

Estava bom, não estava?

Mas tudo acaba, ou nem chega a começar, não sei.

É difícil assumir que não temos o controle sobre as coisas.

É triste entender que por mais que você queira querer algum é o suficiente.

E dói. Dói demais expor a falta de entendimento.

Eu sei o quanto você já riu querendo chorar e o quanto é difícil para você dizer que precisa, sim, que quer, e espera que tudo fique bem.

Essa aceitação de fachada está falida, querida, todos sabem o que você realmente é.

Eu sei melhor que todo mundo, claro.

Sei que nesse exato momento lagrimas escorrem pelo seu rosto enquanto procura, entre as palavras, algum tipo de conforto.

Você vai pegar o celular diversas vezes antes de dormir, vai escrever duzentas mensagens e não mandará nenhuma.

O seu medo de ser presente lhe faz ausente, você não pode controlar.

Eu sei que é nele que você pensa quando alguma coisa dá errada e que você nem imagina porque isso acontece. Eu sei que você não quer pensar em ninguém, e que se esforça pra isso, mas tem sido inevitável.

Não é indicio de sentimento, não é?

Nós sabemos, eu e você, sabemos direitinho que não há de ser nada.

Mas o sorriso que vem dali transmite confiança, a palavra te faz acreditar numa possível solução. Auto-suficiência é bobagem. Ele já sabe que você precisa dele, só precisa acreditar que você não quer saber do passado. Só precisa lhe pegar pela mão, olhar nos olhos e dizer que tudo ficará bem. Não é necessário nem o beijo no final. Apenas as palavras e o olhar de entendimento.

Talvez vocês sejam tão diferentes que ele tenha se transformado no seu porto seguro sem que pudesse evitar.

Talvez seja apenas uma fase que depois de passar lhe mostrará o tamanho da confusão. Talvez tanta coisa que até nós nos perdemos e acho que ninguém, aqui, está interessado em saber.

Eu sei que quando a noite cai, ou o dia vem, você espera arduamente alguma coisa - qualquer coisa - apenas pra sentir que tudo ainda tem razão. Acredita que um dia você tirará os trincos da porta e alguém finalmente vai adentrar seu cômodo vazio.

Eu sei o quanto você quer ficar contente e o quanto você se esforça pra isso.

Eu sei o quanto você despreza qualquer indicio de sentimentalismo pra se proteger e o quanto estão escassas suas armas.

Eu sei que agora tudo está perigoso demais e que sua cabeça já não suporta a tonelada de pensamentos. E sei que às vezes é difícil e que você finge que não, apenas por odiar essa palhaçada toda de sentir.

Você acredita que as coisas, mais cedo ou mais tarde, vão entrar nos eixos, não é?

Tanto quanto você acredita nele.

Tanto quanto você quer acreditar em você.

Na falta de uma mão pra te mostrar o caminho eu mesma te consolo, meu bem.

Se abrace e me leia: vai ficar tudo bem, vai ficar tudo bem, vai ficar tudo bem, vai ficar tudo bem.



quinta-feira, 26 de novembro de 2009

O vermelho do arrebol

Como um equilibrista.

Me mantenho nessa linha tênue, nessa corda bamba que, sem perceber, me faz inclinar cegamente para o lado do sim.

Eu me inclino, por insistência ou vontade pura.

Às vezes não enxergar faz um bem danado ao coração.

Seu corpo faz um bem maior ao meu.

Enquanto o dia nasce.

O arrebol me faz brilhar dentro desse quarto de janelas abertas.

E pertencemos um ao outro até a hora de partir.

Então volto para o meu cômodo vazio, com poeira nos cantos, e guardo a lembrança de um rosto que eu esquecerei dentro de instantes.

Volto a montar minha corda bamba para ensaiar o espetáculo do talvez.

Ando tão circense que às vezes me canso.

Ando cegamente para o lado do sim.

O arrebol me convida a desvendar seu corpo e, sem que eu perceba, ele escancara as janelas do meu quarto quase mofado.

Apos anos de escuridão, e trinco nas portas, me permito ser invadida por um suposto sentir.

Sou desvendada, com um leve sorriso nos lábios, justo por ele, por ele que não se permite tanto quando eu.

Ironia de um destino brincalhão.

Piada na apresentação do palhaço.

Palhaçada, talvez.

Tudo bem, eu não me importo.

Não peço muito e não exijo nada além do que já tenho.

Gosto do arrebol.

Gosto, mais que tudo, das cores.

Gosto de saber que amanhã tudo pode se iluminar dentro do meu quarto vazio.

Gosto de pensar que dentro de instantes - ou não - poderei ser vencida num piscar de olhos.

Sem armas.

Sem guerras.

Sem destruição em massa.

Liberdade.

Apenas a liberdade me faz fluir.

Por me deixar partir deixou uma, certa, vontade de ficar pra sempre;

Talvez eu fique.


Obs: O Blog tava de cu doce e não me deixou mexer na formatação do texto. Traduzindo: praga do Carioca. rs

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Novembro

Correu, para debaixo das cobertas, para não sentir o frio que invadia todo o cômodo. Sorriu, para o espelho, tentando disfarçar a face molhada de água salgada.
Balbuciou qualquer coisa antes que a agonia pudesse alcançar seu corpo. Fosse uma oração, um apelo, uma promessa qualquer para ser curada, ao menos por ora, daquele terrível sentimento arrasador.
Trancada no quarto, com a luz apagada, fechava os olhos com fervor para que, mesmo a força, conseguisse dormir antes do caos. As horas se passaram e ali, naquele cômodo branco, sentiu seu corpo ser invadido.

O sentimento já tomava todo quarto. Um tipo de angustia que provocava desespero, voz rouca e garganta cansada. Gritava como louca e para ninguém, como se daquela balburdia fosse surgir a solução. O coração não parava de bater acelerado e por vezes ela pegou o telefone imaginando a salvação do outro lado da linha.

Silêncio.

A agonia sabe como machucar.

A invadia, todas as noites, quando os salva-almas estavam dormindo, todos, em seus respectivos quartos em suas respectivas casas.
Ninguém acordaria para salva-la.
Ninguém a salvaria.
Encolhida entre as cobertas sente o no se formar na garganta, ela sabe onde isso vai parar.

Mais uma noite em claro evitando pensar, evitando enxergar, evitando sentir.
Mais uma noite de garganta seca e boca cheia d'água.
Mais uma noite implorando por um abraço forte e alguém para lhe dizer que vai ficar tudo bem, mesmo que não fique.
Alguém que talvez esteja tão perto, e tão longe, para querer tirá-la dali.

Na luta por sobrevivência ela sempre perde.
Morre, jogada na cama, cansada da luta diária.
No dia seguinte ressuscitará e pedirá, com força: que o dia termine bem.
Na noite do mesmo dia encontrará a angustia uma vez mais.

Eu quero ajudá-la a se salvar, a se safar talvez.
Quero tirá-la disso tudo e lhe ensinar como é suave se deixar levar.
Quero envolvê-la, olhar em seus olhos densos e lhe apontar o caminho certo.
Quero tanto.
Mas ela não me ouve, ela não me vê.
Anda lado a lado com a solidão a procura do abraço forte e das tais palavras.

Não importa o dia de amanhã se o de hoje terminar bem: diz.

Que seu dia termine bem, menina branca.
Que a semana termine bem.
Que o mês, se possível, termine sem angustias.
Que você consiga viver em paz, e lúcida, até o fim dos seus dias;
para o nosso próprio bem.

sábado, 21 de novembro de 2009

is bone!

Sabe quando você tenta ocupar a cabeça com qualquer coisa e de nada adianta?
Sabe quando sua cabeça ta tão cheia que você chega a se perder entre os pensamentos?
Os meus pensamentos estão despenteados, todos, há mais de uma semana.
E eu não sei o que eu devo fazer para colocá-los no lugar.
Penso que é só sorrir e deixar viver que o resto... Bem, o resto não importa, eu sei, mas penso que o que tiver de acontecer vai acontecer. Acho que eu to cansada de fazer acontecer, sabe? Cansada de tentar. Não que eu passe noites e dias e meses tentando. Não tento quase nunca. Mas esse "quase" já acaba comigo. É tão estranho que eu nem sei o que, e pra quem, reclamar. To ficando de saco cheio de mim. Talvez aquele cara tenha razão ao dizer que eu to "carentinha", talvez eu seja, assim, "carentinha" desde sempre. Realmente eu não sei. Ta tão estranho que às vezes parece que me falta ar. E então começo a fazer coisas por puro desespero. Falo demais. Deve haver pessoas que não suportam mais ver o meu numero no visor do celular. O cara do "carentinha" deve ser uma dessas pessoas (e eu só não ligo pra ele agora porque a realidade me impede). Sei lá. Eu quero tanto escrever qualquer coisa, boa o suficiente, pra ser postado decentemente aqui, mas a cada palavra só faço me complicar. As palavras já não aliviam. Não há remédio, entende? Não há remédio porque eu simplesmente não sei onde dói - nem sei se dói.
E enquanto isso eu fico aqui. Digitando e digitando nesse blog que, pela primeira vez, vai receber um texto sem uma segunda lida. Não paro de ouvir Ney Matogrosso e nesse exato momento estou baixando o filme do Cazuza pra assistir pela milésima vez.

Cartola foi um gênio ao escrever O Mundo É Um Moinho
"Em cada esquina cai um pouco a tua vida, em pouco tempo não serás mais o que és”.


Ainda to vasculhando as esquinas pra achar o que eu perdi.
Por vezes me pego pensando sobre quando foi que tudo mudou.
O problema é o piscar de olhos, eu sei. Quando os olhos se fecham tudo muda. E eu, simplesmente, pisco. Simples assim.
Carioca que me perdoe, mas o desespero me fez poupar os "enters”.
To sentindo um nó na garganta fodido e por mais que eu queira chorar tudo só extravasa pra dentro.
Espero que tudo se acalme.
Espero que a boa nova chegue para me acalentar suavemente.
Espero e acredito.
A minha esperança não morre.
Suavidade, Camila, suavidade: digo sempre.
Um dia eu me escuto.



"Pudesse abrir a cabeça, botar tudo pra fora, arrumar direitinho como quem arruma uma gaveta. Tomar um banho de chuveiro por dentro."

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Depois do fim

"Vamos beber livros e mastigar tapetes
Catar pontas de cigarros nas paredes"
Renato R.
Súbito, como um tiro na escuridão, percebeu: acabou.
Olhou ao redor e vasculhou dentro de si, por horas, procurando vestígios de tudo o que havia acontecido.
Nada. Não encontrou nada.
Parecia que um furacão havia passado e varrido, sem cerimônias, suas lembranças. Não se lembrava de nada. Havia esquecido tudo o que o trouxera até ali.
Estava feliz, estava bem.
Com a mão na boca, e a surpresa lhe invadindo o corpo, percebeu: acabou; estava contente de novo.

domingo, 15 de novembro de 2009

"..."

– você tem tanta vontade de chorar, tanta vontade de ir embora. Para que o protejam, para que sintam falta. Tanta vontade de viajar para bem longe, romper todos os laços, sem deixar endereço. Um dia mandará um cartão-postal de algum lugar improvável. Bali, Madagascar, Sumatra. Escreverá: penso em você. Deve ser bonito, mesmo melancólico, alguém que se foi pensar em você num lugar improvável como esse. Você se comove com o que não acontece, você sente frio e medo. Parado atrás da vidraça, olhando a chuva que, aos poucos começa a passar.

Caio F.


ta tããão doído ultimamente :/

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

É de estimação

O deserto dessas ruas me faz lembrar de coisas que um dia eu quis esquecer. Hoje eu apenas quero revivê-las - mais que tudo e, talvez, mais que todos.
Caminho por horas tentando achar o caminho de volta pra casa, tentando me achar em meio ao caminho.
Tudo é deserto.
Apenas eu e a solidão caminhamos de mãos dadas.
A lua traz seu olhar sem a necessidade de um pedido, traz seus olhos pra tão perto, e tão dentro, que eu não posso, e nem quero, evitar. Choro sem querer. Por ter querer e saber que você não está.
Lamento a ausência que pisa fundo no peito e enche de fel essa garganta cansada.
Já perdi as contas de quantas noites em claro eu passei conversando com as paredes, de quanto tempo eu fiquei em silêncio esperando uma resposta qualquer.
O silêncio predomina até hoje; e as noites são tão longas.
Os sorrisos se perdem em meio ao chão antes que possam alcançar meu rosto. Minha alegria é estéril. Estéril ao ponto de me dilacerar enquanto eu mostro os dentes tentando ser feliz. Idiota quem inventou que pra mostrar felicidade é necessário, e fundamental, mostrar os dentes. Grande criança ingênua. Se eu lhe mostrasse meu coração entenderia o que eu lhe digo.
Por ora a solidão é minha única companheira, somente ela me acolhe quando os dias são tão frios.
A saudade já se foi, há tempos; graças à memória falha, graças ao tempo que não perdoa. O tempo cura tudo - ou não cura nada -, modifica tudo aquilo que ainda não deixou de ser.
Essas ruas, caladas, me remetem àquela cama bagunçada.
Me remetem ao beijo. Eu lembro do beijo.
Traz a tona um gosto, gasto, que agora parece mais meu do que seu.
Borboletas no estomago?
Minha face continua estática, mas o coração sorri abertamente.
Somente o coração sabe a verdade, e apenas a verdade é levada em conta.
Que as mascaras caiam mostrando todos os corações.
Que os mágicos façam o desespero sumir dentro das cartolas.
Que a bailarina dance para sempre no infinito.
Que eu, palhaço de mola, consiga sair, de uma vez por todas, dessa caixa.

"Ando todo intenso. E cada vez mais míope."
Caio F.
No meu caso: cada vez mais BESTA!

domingo, 8 de novembro de 2009

Três cubos de gelo e um porre de banalidade.

E damos graças pelo circulo vicioso. Pelo vicio. Pelas vísceras - minhas e suas. Pelas unhas que nos arranham por dentro e nos levam todo o sangue; mais seu do que meu.
Eu sempre me questionei: e quando o sangue acabar?
Ainda terá a minha vontade para suprir a sua. A minha vontade vai cheirar a sangue convidando as unhas do circulo a se embrenharem em mim.
Sempre disse e sempre falhei.
Que porra de sempre é esse? Não há, eu sei você sabe, mas a esperança salta alegremente em todos os corpos. Uma porra de tesão sempre nasce sem propósito e na hora daquela boa trepada nada acontece. Broxante!
Garganta seca e a boca cheia d'água.
O corpo feito furacão se apaga sem ao menos queimar corpos; sem erupção.
Ninguém goza; todos riem.
Nesses momentos de devaneios lúcidos me vem à mente uma cafonice qualquer:
"Enquanto houver burguesia, não vai haver poesia”.
Nunca me importei com isso. A burguesia fede? Deixe que feda. Que se foda! Não me importo com a porra de uma burguesia mesquinha de merda. É claro que, agora, vai aparecer alguém para dizer o quão egoísta eu sou. Egoísmo é querer mudar o outro porque me incomoda. É querer que a burguesia deixe de ser burguesia para que possa haver versos e temáticas e estrofes de quatro por quatro.
Que porra! A poesia não está no outro. É in. Eu acredito que o caminho é in e não off.
Entende?
Sente?
Ta dentro! Dentro da cabeça, das vísceras, pulsando na veia. Pulsando na vida. Em qualquer lugar. Em todo lugar e a toda hora. Enquanto as horas passam e nos levam os dias, meses, anos, coração...

Dois dedos d'água e três cubos de gelo.
Eu não quero estar lúcida.
Eu não quero estar e nem sei se aceito me ser.
Absinto-me de mim tantas vezes ao ano que no próximo quase não sei quem sou.
Mas as vísceras continuam viscerais, o sangue é fresco e minha vontade ainda supre a sua. Porra! Eu sei que eu não presto. Eu sei que, pior que isso, eu não quero prestar.
Mas a boca ta cheia d'água e a garganta ta seca, entende?
É in, não off; é infernal!

sempre me sobra banalidades

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Mal necessário

Quando eu a vi ali, dançando em minhas mãos, eu quase não acreditei. Desacreditei total. Crise total! Murmurei alguma coisa, qualquer coisa, com os olhos comprimidos de ódio; peito aberto qual fratura exposta — doía e sangrava tanto quanto. Não cicatrizava. Não cicatrizaria nunca, eu sabia. E no momento me tornei a pessoa mais burra do mundo. Idiota que nasceu sabendo que pedra atirada no vidro resulta em cacos e, ainda assim, encheu de pedras a mão do garoto na rua e disse: atira!
Cacos.
Fiquei olhando para ela, sentada na palma da minha mão, e passei a ouvir zumbidos que jamais foram ouvidos. Vinham de longe ou de dentro ou de lugar nenhum, mas vinham eu sei que eles vinham e que, agora, viriam todas as noites. Eram muitos e, todos, diferentes; traziam-me aquela antiga sensação de sentir qualquer coisa que jamais se quis sentir ou pensou sentir ou apenas sentiu. Qualquer coisa, sem sentido ou não.
Os olhos já se encontravam dilatados de puro ódio e o coração se comprimia em medo.
Um medo puro que me cortava de cima a baixo quando eu a via jogada em minhas mãos, quando eu, de fato, sentia que ela estava ali, que era minha e não iria embora. Pensei em tirá-la a força, meu deus.
Por DEUS!
Pensei em autopsia, dissecação, faca amolada e até bala perdida.
Pensei em tudo; em todos.
Até perceber que seria inútil; eu estava mais dentro dela do que ela dentro de mim. Era eu quem deveria tê-la deixado em paz, eu quem deveria ter ido embora ou, talvez, nunca ter tocado em tal fogo ardente. Tarde demais, não é?
Tarde demais: a única coisa que todos pensam quando tudo deu errado.
Eu pensei; e estava com a razão.
Acordei e a vi ali, dormindo em minhas mãos, ressonando tranqüila, com cara de gente feliz, com aquele jeito de quem veio pra ficar e que não iria embora por qualquer incisãozinha. Foi esperta; apareceu no meio da noite para não lutar contra minha recusa, para não haver recusa alguma.
Merda!
E eu, agora com a sensação me socando o rosto, acarinho suas formas de Menina-moça que virou Mulher. Ela, a Certeza, havia se tornado enorme diante dos meus olhos; e como todas as certezas que aparecem de súbito, no meio da noite, não vão embora, fui obrigada a optar pela única opção que me restara: aceitar.
Aceitei.

domingo, 1 de novembro de 2009

Contestando a noite

Voltamos nos entrelaçamos e partimos. Simples como a natureza das coisas que se modificam. Fácil como as coisas que por si próprias acabam. Sem autodestruição, apenas o fim. O desaparecimento. O atravessar da rua. Sempre há o atravessar. E há vezes em que ele ultrapassa fronteiras tão finas quanto invisíveis. Somos ultrapassados por vezes. Talvez por isso eu não acredite que eu sou a chuva.

E tão pouco desejo ser o sol.

Sou o nublado de um céu repleto de nuvens, repleto de eus e vocês e escolhas mal feitas. Eu me acostumei com o não. Tanto que já não sinto necessidade em voltar atrás. Já não sinto tanta coisa que enumera-las seria quase impróprio.
Eu só penso que a vida do soldadinho deveria ser mais doce, mais leve, mais brisa.

Penso quero creio.

Eu, o palhaço de mola que sai de dentro da caixinha, acredito no amor da bailarina que dança alegremente por todo quarto. A dança o encanta, e o entorpece, o faz esquecer da dor criada por minhas piadas infames. Eu sempre achei o palhaço o mais sem graça dos brinquedos, mas é esse o meu papel. Se eu fosse a bailarina talvez tudo fosse diferente, talvez fosse mais fácil de entender.

Ah! Soldadinho, se eu pudesse amenizar sua dor sem trair a mim mesma...

O que fode é essa insistência em ver o eterno no perecível, essa vontade de semear ilusões no fundo quintal. Promessas te fodem, me fodem, nos deixam fodidos. Promessas são ilusórias, meu bem. O mundo pode acabar amanhã.

Voltamos.
Nos entrelaçamos, e partimos, enquanto o Soldadinho nos via ir embora. Me olhou, tão estranho, como quem dizia, sem dizer: cedo ou tarde descobrirás que é chuva.

Ah! Soldadinho, suas certezas são tão deprimentes.

Quando vai entender que não há certezas?
Quando compreenderá que eu sou apenas isso que os teus olhos podem ver?
Não há segredo, não há esconderijo, nem vontade de ser bailarina.
Sou palhaço.
Palhaço de mola que sai de dento da caixinha e vive essa piada, às vezes sem graças às vezes feliz.

Mas a cada dia que passa as ilusões, plantadas no fundo do quintal, invadem com mais ferocidade sua casa. Invadem o teu peito e te fere com os espinhos. Ilusões são roseiras sem rosas. Fere. Machuca. Sangra. E quando eu apareço salpicando tudo com álcool, a dor é tão grande que você esquece os espinhos e me culpa por te fazer chorar. Eu tento explicar, você finge entender, mas em terceira pessoa fere tanto quanto, não é?
Pois é.

Você lamenta minha incredulidade teimosa.
A bailarina dança ao som da sua musica.
Eu vivo a piada e lamento por nós.

Agora já não sei, ao certo, o que os teus olhos tentam me dizer; talvez seja apenas descaso pela minha falta de compreensão, talvez seja vontade de me fazer sangrar de outra maneira que doa tanto quanto as ilusões-navalhas — mesmo que pra isso seja necessário provar que estando longe tudo fica mais fácil.

Eu só penso que sua vida, Soldadinho, poderia ser brisa.
Penso quero creio.
Eu vou te deixar ir embora e prometo que não farei com que sinta o peso dos meus olhos.

Vai ser brisa, baby. Vai dançar.
Deixa que o restante o coração ajeita.