quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Sobre o homem da minha vida

por Carolina


Não; eu não estava procurando o homem da minha vida. Não foi por isso que eu deixei tudo para trás e troquei as fechaduras e alguns números necessários. Eu não pensei, em momento algum, em me afastar de tudo para viver um novo, e belo, amor-água-com-açucar-digno-de-sessão-da-tarde. Eu não saí em busca de nada e nem caçando homens por aí, como uma loba selvagem. Não listei os mais interessantes e cultos e canalhas. Esses são os meus favoritos: interessante, culto e canalha.

Aquele amigo que beija bem adora inglês e lê bons livros ou aquele professor de história que todo mundo diz que faz atrocidades na cama: os melhores.

Aqueles que têm tudo para dar certo e que, exatamente por isso, não dão. E você é tão ciente que sabe que vai ceder e que vai rolar, por pura sacanagem, e os telefones não vão tocar no dia seguinte.

Tudo bem, o beijo é bom, o sexo idem. Todo mundo cult, todo mundo zen, todo mundo satisfeito depois do orgasmo.

O Homem da minha vida não existe, é isso que eu preciso te dizer. Porque o homem da sua vida também não existe, e nem o homem da vida da sua vizinha. Pode acreditar.

Há milhões de homens por aí, há milhares de encontros por dia, troca de olhares, telefones trocados, flerte na internet... E você vem dizer sobre O homem da sua vida?

É quase um absurdo.

O problema é que eu cansei dos homens da minha vida.

Cansei de atender ao telefone, cansei de dar explicações e ter de dizer que eu prefiro o serzinho-um ao invés do serzinho-dois. Cansei de dar sempre um sorrisinho de compreensão após aquela conversa chata em que ele se safa e eu me fodo. Eles sempre me fodem; e não há orgasmo algum.

É um porre!

E depois vêm me dizer que eu bebo demais e que eu deveria parar de fumar e que não me entendem e que eu sou estranha. Eu sou é bacana demais; e com os três. Outras, no meu lugar, desligariam o telefone, não passariam noites em claro e jamais, eu disse jamais, aceitariam certas coisas, tão ralas e gastas, como eu aceito.

Sumir: é essa a solução para quando as histórias se atropelam, não é? Sumir. Desaparecer.

Aconselhei-me: Suma, Carolina, suma, desapareça!

Poxa, quando o telefone começa a tocar demais e você já não sabe o que dizer ou gagueja ou se preocupa ou, então, faz as três coisas ao mesmo tempo, é sinal de que acabou. Você não serve mais para o negocio. A sua idéia de juntar três pessoas para montar um amorzinho perfeito foi patética.

Nossa! Como eu odeio usar a palavra "perfeito", deve ser porque eu sei que não existe. O pior é que eu sabia, mas parece que a cada dia fico mais burra, mais patética.

Patética, sim, tem tudo a ver comigo.

E foi então que a CarolinaPatética resolveu sumir. Troquei algumas fechaduras e o número de telefone. Coloquei meus óculos escuros e, quando saí de casa, lá estava ele parado no portão. Pra quê? Por quê? Eu não sei. Eu não sei, mas eu gostei e o beijei como quem diz, sem dizer, que ele era o meu favorito - talvez nem fosse, mas no momento era - e que se eu fosse sumir queria que ele sumisse comigo e eu disse, dessa vez dizendo mesmo, que eu gostava dele e que senti falta daquele beijo - nem sei se eu fui sincera, talvez tenha sido sincera demais.

Mas não, eu não estava procurando o homem da minha vida, e talvez esse tenha sido o grande problema. Ele me achou, saindo de casa, e eu me deixei ser achada por ele que eu adorava tanto - talvez mais que os outros.

Sorri e tive a certeza de que ele era o meu homem.

Não sei se da vida, se da semana, do ano, do mês... Mas o meu homem.

Era ele quem eu queria, era a imperfeição mais bacana que eu já conheci. E tudo isso por que ele estava lá fora me esperando?

É, Carolina, você se contenta com pouco, merece mesmo se foder.

Talvez eu até mereça.

Talvez eu até goste um pouco.

Eu sei quem eu quero; e se for pra foder que, ao menos, haja orgasmos múltiplos.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Abril

Livro fechado, página 12.

A nossa fotografia marcando o lugar onde eu deveria voltar após a pausa.

Se eu não tivesse a olhado, se a fotografia fosse outra, se eu não precisasse fazer uma pausa ou se, ao menos, tivesse um marcador de páginas qualquer. Nada. Somente aquela fotografia em preto e branco. Para ser honesta ela nem sequer chegava a me incomodar, sua imagem não me incomodava, nem me invadia ou causava qualquer outra sensação que eu pudesse citar e prolongar somente para te maldizer ao mundo. Sua imagem não causava coisa alguma. Talvez o que tenha me colocado nessa pele frágil, que agora visto, tenham sido as cores.

Monotonia pura. Silêncio.

A ausência, gritante, loucamente muda aqui dentro. Eu não tenho forças, nem fôlego, talvez nem haja voz para gritar a merda de uma verdade que eu trago amassada no bolso. O silêncio é pesado demais. Esse silêncio de camas vazias e mãos separadas, que invade o quarto no meio da noite enquanto ao lado dois corpos se amam.

Não; eu não sinto a sua falta e eu não estou tentando dizer nada alem do que eu já estou dizendo, e quase cuspindo, nesse papel amarelado que talvez você nem chegue a ler. Poderia pontuar, aqui, todas as coisas que eu sempre quis que você soubesse ou adivinhasse ou, quem sabe, entendesse, mas estou tão lúcida agora que eu sei que de nada adiantaria. Os telefonemas, as explicações, as horas de conversa jogada fora, em frente ao portão, não adiantaram, por que um pedaço de papel mudaria alguma coisa?

Palavras, palavras, ando tão descrentes delas.

O tempo todo você esteve errado. A ilusão da sua ótica te levou para o extremo oposto da ilha que pintamos e jamais existiu. Eu lembro das pegadas na areia e do seu cabelo bagunçado indo embora. Eu me recordo, perfeitamente, da sua ida, da roupa que usava e o brilho meio opaco que o sol produzia em seus ombros.

Seria lindo se não fosse triste.

De sua vinda eu não me recordo e, para ser sincera, não me recordo de vinda alguma, e é nessas horas em que eu me pergunto se algum dia você realmente veio. Eu não sei. Não me lembro da cor dos olhos e nem do contorno dos lábios, tampouco de alguma expressão colada em seu rosto. Talvez eu não conheça o seu rosto. Talvez você tenha passado por mim milhares de vezes sem que eu o tenha notado.

Mas você esteve errado durante todo o tempo.

Eu não sou assim, eu não quero ser assim.

E eu não quero afastar ninguém e nem me lembrar das costas se distanciando sem poder me despedir. Não me satisfaz manter essas verdades esmagadas no bolso e muito menos abafar esse grito patético que quer sair daqui.

Não; eu não quero liberdade alguma.

Liberdade demais só faz prender minhas asas e embaçar minha visão. Eu não quero ser presa, eu não quero ser solta. Eu não quero uma lasca sequer desse querer, quase porco, que se faz necessário em mil corpos por aí.

Eu não quero coisa alguma.

E é necessário que você saiba que eu não sinto a sua falta e tampouco sua presença. Nem senti aquela sensação morna que poderia ter se transformado em saudade após uma olhada rápida na fotografia marcando a pagina 12. Nem sequer sinto vontade de olhá-la para poder recordar os traços, finos, do seu rosto tão jovem.

Eu não sinto vontade de nada. Eu não quero.

E você esteve errado o tempo todo, eu não sou assim, eu não quero ser assim.

Nunca pintamos ilhas, nunca houve cama cheia ou mãos unidas. Nunca senti sua falta e não vou sentir agora e não vou sentir nunca.

Não há falta e não há presença.

Não há marcador de paginas em preto e branco.

Nunca mais reabrirei aquele livro.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Vozes

Gessinger, 1987

se você ouvisse
as vozes que ouço à noite
acharia tudo que eu faço natural
se você sentisse
o medo que eu sinto no escuro
se você soubesse
o mal que o sol me faz
não me pediria pra repetir
revoltas banais
das quais eu já me esqueci

se você ouvisse
às vozes que ouço à noite
às vezes me assustam
outras vezes me atraem
se você sofresse
tanto quanto eu sofro
com a solidão
se você soubesse
O quanto eu preciso da solidão
não me pediria pra repetir
frases banais
das quais já me arrependi

duas pessoas são duas verdades
e, na verdade, são dois mundos
a cada segundo, o pânico aumenta
e uma sombra arrebenta
a porta dos fundos

se você sofresse
tanto quanto eu sofro
com a solidão
e precisasse
tanto quanto eu preciso
da solidão
não me pediria pra repetir
gestos banais
iguais aos que eu nunca fiz



eu não conseguiria descrever meu estado tão fielmente

ps: não tô abandonando o blog, talvez eu esteja "me abandonando". momento de transição. procurando novas maneiras e novos caminhos. uma pausa pra respirar, talvez.


terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

O sétimo

Me pego sempre desatando os nós enquanto alguém ri uma risada fina bem longe.

Em meio aos meus devaneios posso garantir que conheço aquela voz.

Algumas horas depois reconheço: é minha.

Eu rio, ao longe, enquanto trabalho; mão roxa de tanto forçar o afastamento das cordas; corpo dele e loucura minha, juntos numa encenação patética sobre laços e pessoas que dizem sentir.

Não sente, eu sei.

Não sente.

Não fique, vá embora.

Eu disse, desde o inicio, que depois de certo tempo seria quase impossível desatar aqueles nós, as cordas se moldariam uma a outra e se acomodariam sem perceber.

Mas mesmo assim ele fez questão de fazê-los, um por um, um atrás do outro, fingindo ser regido por algum sentimento que eu já desconhecia.

E onde está você agora, enquanto as minhas mãos sangram?

Onde está você enquanto meu corpo se rasga ao olhar pra trás?

Está fazendo nós, vários, muitos, e certamente usando o mesmo motivo que me fez acreditar.

Então, com essas mãos ardendo em brasa, eu te odeio!

Simplesmente porque, depois de lançada, a flecha não volta.


meio relapsa, eu sei, mas eu tô por ai. rs