quarta-feira, 31 de março de 2010

o trago

tem que ser denso. tem que ser fundo. lento. tal como o primeiro trago de um cigarro bom após uma semana sem fumar. tem que ser totalmente maluco e mundano. tem que estar entre os meus dedos e levemente alcançar a minha boca. tem que me levar. pode ser durante um banho. um banho quente. não; um banho excessivamente quente. fumaça se misturando a fumaça, meu corpo nu se perdendo nas sombras. meu corpo perdido entre quatro paredes enquanto a água escorre pelos meus traços. braços e pernas e colos e bocas se desenhando dentro de mim. parece que a única salvação é me manter de olhos fechados. sem nexo, talvez. jamais se ouviu falar em nexo. sentido algum já existiu em lugar algum. demoro mais do que eu imaginava e o que fora cigarro agora são cinzas caídas sobre meus pés. eu nem pude o consumir por completo. somente um trago. somente aquele trago. o único. ao menos foi lento. denso. calmo e eufórico como deveria ser. foi o trago. talvez eu fique sem escovar os dentes durante o banho, só pra sentir aquele gosto por mais alguns minutos. será um banho rápido, prometo. não passará de uma hora. uma hora inteira de água quente, desejos, e gosto de lentidão. uma hora de relaxamento depois de platonismos e platonismos. amor platônico é tão bonito, assim, jogado num papel. mas, eu juro, entre aquelas paredes enquanto a água me consumia, eu o vi como uma opção válida. por hora, apenas. depois passou. sempre passa. só quero que faça bem a ambas as parte. tem que fazer bem. tem que ser denso e eterno - mesmo que dure somente o tempo de um banho. tem que haver sorrisos e filmes e horas de conversa jogada fora. quero sorrisos. com segundas intenções, terceiras intenções, quartas, quintas. múltiplas intenções ou intenção alguma. quero a sutileza de um suspiro e a brevidade de um orgasmo. quero o efêmero e o eterno, juntos, no mesmo ser - sem linha tênue alguma para separar. não quero separação. quero bem perto. entre meus dedos. quero encostando em meus lábios. quero tudo fora da caixa, espalhado pelo chão. quero desordem. quero perder a cabeça. quero viver e sentir, tudo, nessa lentidão que é me dada. tenho tempo. temos tempo. há todo tempo do mundo. sem problemas e sem questionamentos. quero viver a leveza do que é leve e só. quero participar de tudo o que eu sempre achei clichê e cafona e talvez eu seja cafona e clichê por pensar assim. quero ser. eu quero tudo. tanto. e tanta intensidade sempre acaba me iludindo com o que é fugaz. se eu não gostasse tanto da fugacidade das coisas... eu quero. e o que eu quero não é nada além do primeiro trago de um cigarro que, eu sei, quando menos imaginar não estará mais em minhas mãos.

2 comentários:

Amanda Galdino disse...

fim.
foi-se meu dia, como seu cigarro deixou apenas as cinzas, eu deixei apenas a vontade de mais e mais de suas palavras.
anseio maldito pelo o que você diz.
mas me intensificou.
meu dia acabou, como seu cigarro.
mas vou tomar um banho e lembrar suas palavras.

EmileJ disse...

MUITOOOOOOOOO BOMMMMMMMMMMMMM ARLEQUIMMMMMMMMMMM *________*