segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Disritmia

Eu o imagino caminhando devagar, lento, passo a passo, em minha direção. Ele vai sorrir e me abraçar com aquele abraço que desde sempre foi tão nosso, vai dizer coisas sem sentido e eu vou sorrir, mesmo que eu não queira, só para mostrar minha felicidade em vê-lo caminhando, passo a passo, até mim. Talvez ele reclame do cheiro de cigarro e depois diga que eu preciso beber menos e me entregar mais. É claro que dirá que tudo não passou de um pesadelo - essa parte é fundamental.

Apenas um pesadelo, criança: dirá, com as mãos cravadas em minha cintura.

Eu vou permanecer quieta e sorrindo, mesmo que eu não queira, só para mostrar minha felicidade em tê-lo aqui. Vai ficar um tempo me olhando com cara de bobo e dirá, centenas de vezes, o quão bonitinhos são os meus trejeitos, o quão bonito é o meu sorriso e o quanto não entende o que eu espero das pessoas. Nesse momento eu vou pensar em beijá-lo para fazer com que aquela boca, que fala demais, se cale. Vou pensar e desejar e até sentir a língua dele tocando a minha.

O máximo que farei, sem pensar, se resume a tirar o sorriso do rosto - sem mas nem por que.

Vou deixar meu sorriso se esvair pelo desejo e pelas palavras não ditas. O silencio vai ficar sentado entre nossos corpos, tão amigos quanto amantes, e eu vou esperar, ardentemente, sua boca colar na minha. Espero. Espero. E no meio desses segundos, que mais parecem a eternidade, vou me encontrar em certos devaneios inevitáveis.

Vou olhá-lo e não vou reconhecê-lo.

Vou repudiar seu abraço e dizer, sem precisar falar, que o amargo daquela boca me enoja. Em minha mente vou idealizá-lo caminhando devagar, lento, passo a passo, indo embora. Eu vou olhar aquelas costas e vou maldizer todo, e qualquer, desejo que apareça ao ouvir seu nome. Vou odiá-lo por três eternos segundos...

Até ele sorrir e dizer: foi tudo um pesadelo, minha menina.

Então o nosso abraço vai nos unir sem ser necessário dizer nada. A mão que se encontrava em meus cabelos deslizará, agora, até minha cintura e ali permanecerá. Nossos olhos se encontrarão, e se perderão, até uma boca encontrar a outra. Acontece. Enfim acontece: o beijo poético. As bocas, de tão amigas, se reconhecem de imediato. O beijo flui. Faz renascer o desejo de ficar perto, ficar junto. A mão está cravada em minha cintura enquanto eu tento fazer com que ele entenda que eu não espero nada das pessoas. Eu jamais espero. O tempo nunca foi, e nem será, o aliado de sentimento algum, meu bem. O tempo traz o esquecimento. O tal esquecimento que em certas horas me parece tão encantador. O esquecimento me traz a calmaria e os passos que caminham pro extremo oposto.

Viro o rosto.

Saio correndo sem me importar com os pedaços que ficam pelo caminho.

Longe dos olhos, longe do coração.

Abro os olhos.

Enxergo tudo.

Enxergo o caos.

Em minha frente, com as mãos coladas nas minhas, se encontra o novo. Ao longe, meio apressado, posso ver as costas que eu tanto temi enxergar. Os passos, ligeiros, se seguem na direção oposta. E eu me encontro sorrindo, mesmo sem querer, para mostrar a minha satisfação pelo desfecho da história. Sorrindo para dizer que eu fiz, finalmente, a coisa certa. Sorrindo para dizer que eu não posso mais enquanto o novo me encara e eu luto contra o coração que insiste em reviver - ou reavivar - sentimentos mortos.

Em meio aos meus devaneios me imagino correndo e correndo até alcançá-lo e fazê-lo entender o que eu espero das pessoas.

Até direi: eu espero por você.

E ele entenderá, de uma vez por todas, que é necessário aceitar meu amorzinho ralo, e tosco, e que é a única coisa que eu tenho para oferecer e só ofereço a ele e a mais ninguém. Ele vai sorrir, mesmo sem querer, só para mostrar que ele entende o que eu estou dizendo.

E eu...

Eu vou embora.

Volto para casa com a certeza de que ele jamais entenderá coisa alguma. No meio do caminho ele vai pedir que eu volte, mas eu estarei longe demais para ouvi-lo. Ele vai correr e não vai me alcançar. Vai se explicar e eu, como criança mimada que só pensa em dar o troco a todo custo, vou me negar a entender.

Antes de me entregar ao novo ainda vou me obrigar a olhar pra trás e ver como era o caminho. Ele ainda estará lá, caminhando, apressado, na direção oposta. De súbito imaginarei outro ser a esperá-lo e então vou passar a acreditar que aquilo que eu pensava ser tão nosso sempre foi de qualquer um.

Choro pela certeza estampada nas paredes.

Choro por saber que a minha verdade nunca passou de uma mentira rala (e eu, tola, preocupada com a escassez do meu sentimento).

Corro.

Corro na direção oposta.

Me deparo com o novo que me sorri enquanto aperta minhas mãos. Meio desajeitada levo as mãos até minha cintura e o beijo como se fosse a única coisa que eu precisasse naquele momento.

Enquanto o coração me faz relembrar a imagem das costas eu o beijo e repito, mentalmente, a mesma frase até ela se tornar certeza: Longe dos olhos, longe do coração. Longe dos olhos, longe do coração. Longe dos olhos, longe do coração. Longe dos olhos, Longe dos olhos, Longe dos olhos... Longe do coração.

Baby, when I know you're only sorry You got caught

6 comentários:

Vanessa Souza disse...

Imagine, imagine...

EmileJ disse...

pega na mão do novo e vai se feliz :D
'longe dos olhos, longe do coração'
tem que aprender que pode existir o ' perto do olhos, longe do coração'.
um dia, um dia vc larga tudo e pega na mão do novo \o/

Rhaissa disse...

E o novo um dia vira o velho. E o velho vai dar as costas e caminhar na direção oposta. E você vai chorar, e vai correr, e vai negar, e vai beijar o novo... novo.

E o tempo... o tempo vai fazer esquecer.

Então, é isso aí, se agarre com o novo, se agarre ao novo.
Ano novo, vida nova?! RISOS.

.-.

Eu, Thiago Assis disse...

tá tudo tão bem traçado que até parece um sonho.. é um sonho?

Darla disse...

Eu acho absurdaaaa a capacidade q vc tem de descrever todo o momento em q eu me encontro qd leio cada post seu... parece q te conheço! hahaha..

esse texto é MTO o q tá acontecendo comigo essa semana!

=*

Lua_Adversa disse...

Desculpa a invasão, nem nos conhecemos. Mas não tive como não ler. Comecei e foi fluindo e indo e indo, e entrando, comendo, sendo comido, me fazendo fugir do mundo. Pelo visto, você escreve muito bem. Li o texto mais recente e este. Bem, se continuar assim, vai longe.
Beijo grande. Amanda Sotero