Por Camila Barbosa
Twitter: @mamila_caria
E-mail: camila.mih@hotmail.com
As luzes se acenderam e, agora, eu podia vê-lo claramente.
As mãos caídas sobre as pernas, o corpo exausto e aquele ar
de quem sabia onde estava, como chegara até ali e o porquê da vinda. O sorriso
ainda era o mesmo, igual há três séculos – ou três minutos, não sei –, quando a
gente se viu pela primeira vez. Agora só eu o via. Só eu o ouvia. Só eu.
Eu só.
Era domingo, as cortinas se fecharam, as luzes se acenderam
e eu encontrei aquele que eu sentia tanta falta. Ele não me via. Não podia me
ver ou não queria ou não conseguia ou apenas queria não conseguir. E eu me
entorpecia daquele cheiro que vinha só dele.
Por Deus, como eu quis beijá-lo aquela noite. Como o meu
coração sentiu necessidade em senti-lo, como eu precisava, arduamente, daquele
corpo sobre o meu ao menos uma vez mais.
Ele permanecia estático; as mãos caídas sobre as pernas, o
sorriso de exaustão nos lábios. Eu já me encontrava contorcida ao chão, vestida
em cólera, rezando para saudade me deixar em paz.
As memórias, agora acordadas, corriam como vultos em minha
volta, entoando canções que me transportavam para um mundo paralelo ao meu.
Empurravam-me para qualquer coisa, para qualquer um; faziam-me contorcer a
olhos vistos e gritar teu nome por todos os cantos do quarto. Gritei até alguém
me ouvir, até a garganta sangrar, a boca arder e a audição ficar escassa.
De nada adiantou.
Você nem se moveu.
Sequer olhou em minha direção. Continuou imóvel, misterioso,
lindo, dormindo em sua moldura de fotografia.
Eu sabia que a claridade machucava, eu sabia o quão segura a
escuridão podia ser.
Agora me pego dançando a sua volta, tentando trazer qualquer
vestígio de atenção para mim, tentando provocar qualquer sentimento por menor,
e mais impuro, que seja. Qualquer um!
Me odeie, me maldiga, morra de raiva ou, então, de nojo.
Cuspa em mim.
Escarre. Jogue-me num canto qualquer e me corte, me queime.
Qualquer coisa, amor, mas, por favor, não me olhe como se estivesse olhando o
nada.
Tire esse sorriso do rosto, tire as mãos das pernas, feche
os olhos e durma. Descanse. O mal já foi embora, e eu zelarei por você.
Os meus olhos estão cansados de olhar os seus que mais
parecem promessas. Meu coração não suporta bater tão descompassado. E o meu
corpo, lasso, não é capaz de abrigar tanta vontade.
Saia dessa redoma que te protege. Saia de si. Crie
vida, vem para o mundo. Vem para o meu mundo e dançaremos, livremente, nesse
breu que nos consola.
Ah, se eu soubesse como lhe trazer pra perto...
Se eu soubesse como lhe tirar de dentro e colocá-lo ao lado,
eu o faria. Sem duvidas, sem culpas, sem pena.
Mas eu não sei.
Enquanto o seu viver me consome eu só peço, a qualquer um,
que os telefones toquem, que as cartas cheguem e que, enfim, esse porta-retrato se quebre.